De início, a primeira Constituição republicana vedou
o ensino religioso nas escolas públicas, bem como qualquer subvenção de
estabelecimentos de ensino confessionais. Porém, nas constituições que se
seguiram (1934, 1937, 1946 e 1967), houve uma tendência à atenuação da
laicidade estatal, passando-se a admitir certas contribuições entre o Estado e
institutos educacionais confessionais, com possibilidade de reconhecimento de filantropia
e com concessão de bolsas de estudos. O abrandamento foi justificado pela
necessidade de proporcionar às famílias menos abastadas a opção por um ensino confessional
sem que o Estado o oferecesse diretamente. Os mesmos textos constitucionais
passaram a assegurar (1934, 1946, 1967) ou a facultar (1937) a oferta da
disciplina ensino religioso nos currículos das escolas públicas, sempre com
matrícula ou freqüência facultativa [1].
[1] Para uma pesquisa mais abrangente sobre o tema ver:
CURY, Carlos Roberto Jamil. Ensino religioso e escola pública: o retorno de uma
polêmica recorrente. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 27,
p.183-191, set./out. /nov./dez., 2004. FISCHMANN, Roseli. Escolas... op. cit.
Há inúmeras matérias na mídia impressa e eletrônica sobre o ensino religioso
nas escolas públicas e nas universidades. Por exemplo: MARTINS, Elisa; FRANÇA,
Valéria. Rosinha contra Darwin: Governo do Rio de Janeiro institui aulas que
questionam a evolução das espécies. Revista Época, Rio de Janeiro, n. 314, 24
maio, 2002. MINC, Carlos. Só faltam a Inquisição e o óleo fervente. O Globo,
Rio de Janeiro, 01 abr. 2005. PEREIRA, Aldo. Subversão teocrática. Folha de São
Paulo, São Paulo 04 dez. 2006. FISCHMAN, Roseli. Ameaça ao Estado laico. Folha
de São Paulo, São Paulo, 14 nov. 2006. Editorial. Religião e Estado. Folha de
São Paulo, São Paulo, 15 maio 2004.
O ensino religioso
nas escolas públicas [2] sempre foi um tema que
suscitou grandes debates e discussões. Ao longo da história brasileira a
referida disciplina apresentou um caráter confessional-cristão, estando
estreitamente vinculada aos interesses do grupo religioso hegemônico.
Entretanto, com a Lei Federal 9.475/97 o ensino religioso recebe uma nova
configuração que busca afastar-se de toda forma de confessionalismo e
proselitismo religioso. Mas até que ponto o ensino religioso se afasta do
confessionalismo ou do proseletismo?
Há uma centena de defensores
do ensino religioso custeado pelo Estado. O principal argumento em defesa é
justificado sob a perspectiva de que o mundo contemporâneo está vivendo a “disnomia da vida moderna” (Romano,1979, p.
127) que aponta a “ausência de valores” e a “evidente” incompetência da família
e da própria Escola brasileira em adequadamente fornecê-los, fenômeno
concomitante ao crescente individualismo. Nesta perspectiva, o ensino religioso
seria um elemento formador e transformador para os jovens, estimulando a
solidariedade entre as pessoas e auxiliando na estruturação de relações mais
harmoniosas na sociedade, “construindo cidadania”. Mas até que ponto? Seria
mesmo este ensino agregador ou segregador? Ele irmana ou separa?
Há atualmente
inúmeros trabalhos com esta temática, mas poucos são os trabalhos e comentários
com uma fundamentação histórica, sociológica ou
filosófica contrárias ao ensino religioso.
Diante de uma
situação clara de promoção do laicismo elaboramos três argumentos para que o
Estado brasileiro não se envolva numa questão de grande complexidade como esta.
[2]
CURY, Carlos Roberto Jamil, (1993). Ensino
religioso e escola pública: o curso histórico de uma polêmica entre a Igreja e
o Estado no Brasil. Belo Horizonte: Faculdade de Educação da UFMG, Educação
em Revista, nº 17, jun., p. 20-37. Ensino religioso na escola pública: o
retorno de uma polêmica recorrente. Revista Brasileira de Educação: Set /Out
/Nov /Dez 2004 No 27.
Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (1961 e 1996) [3] foram promulgadas com uma
cláusula que proibia o uso de recursos públicos para o ensino religioso nas
escolas públicas - um avanço na direção da laicidade do Estado. Mas, essa
cláusula foi retirada das duas leis, pelo mesmo Congresso que as promulgara,
por causa da pressão da Igreja Católica - outro recuo na laicidade.
Deve existir uma
divisão muito acentuada entre o Estado e a Igreja (religiões em geral), não
podendo existir nenhuma religião oficial, nem Ensino Religioso propocionado
pelo Estado, devendo, porém, o Estado prestar proteção e garantia ao livre
exercício de todas as religiões.
O Brasil, desde
1891, com a Constituição Republicana, deixou de ser um Estado Confessional,
sendo, há mais de um século, Estado Laico, ou seja, os poderes Executivo,
Legislativo ou Judiciário, em todos os seus níveis, estão constitucionalmente,
como contido nos artigos 5o, Inciso: VI, e, 19, inciso I, da Carta Magna de
1988, proibidos de professar,
influenciar, ser influenciado, favorecer, prejudicar, financiar, qualquer
vertente religiosa, pois não existe religião oficial em nosso país, sendo
este, entre outros, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.
Desta forma, independente da
quantidade de fiéis, tempo de existência, ou do patrimônio que uma religião possua todas as manifestações de religiosidade ou credos, seja
evangélico, católico, espírita, judaico, oriental, muçulmano etc, bem como, os
ateus, humanistas e agnósticos etc, nas
questões de fé gozam de igual proteção do Estado Laico.
[3]
Vale lembrar que os dispositivos legais da
educação brasileira estão atualmente: BRASIL, MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (1997). Lei
nº 9.475/97, dá nova redação ao artigo 33 da Lei nº 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
Brasília: Diário Oficial da União, 23 de julho e 1997, seção I.
[4] Ver: Lei nº 9.394/96- Estabelece as diretrizes e bases
da educação nacional. Brasília: Diário Oficial da União, 20 de dezembro de
1996, seção I. Brasil, Ministério Da Educação, Conselho Nacional De Educação –
Ensino religioso na escola pública Revista Brasileira de Educação 191. Parecer
CP/CNE 05/97, sobre formação de professores para o ensino religioso na escola
pública do ensino fundamental. Câmara De Educação Básica, Parecer 012/97,
esclarecendo dúvidas sobre a Lei nº 9.394/96, em complemento ao parecer
CEB/05/97 & Parecer 016/98, sobre carga horária do ensino religioso no
ensino fundamental.
Pedagógico de cada
unidade escolar adaptar tal legislação à sua realidade vivencial, tirando ou
restringindo direitos individuais que a Constituição Federal assegura. Daí o
conflito: quem será o professor? Qual é o conteúdo programático?
O nosso país, por
esta razão, necessita preservar a condição de Estado laico e, para tanto,
precisa evitar a indevida intromissão estatal como a de promover o ensino
religioso nas escolas; não é preciso dizer que tal preservação não torna o
Estado brasileiro ateu.
Aqueles que querem
atenuar a questão do ensino religioso usam o argumento da “matricula
facultativa” prevista em Lei. Mas isso pode gerar outros problemas.
A facultatividade da matrícula apresenta aspectos
problemáticos, pois a escola deverá oferecer atividades alternativas aos
estudantes que não estiverem matriculados, sem que eles sejam por isso
discriminados, quer pelos docentes, quer pelos colegas.
Outra polêmica levantada ao espírito do dispositivo legal
e que serviu de base para se criar Leis Estaduais sobre o ensino religioso foi
a expressão: “sem ônus para os cofres públicos”. Daí grande oportunidade se
abriu aos mais diversos grupos religiosos e se precisou de outras leis para
regulamentar o ensino. De modo confessional (separação por grupos religiosos, cada
qual sendo educado por autoridade de sua denominação) ou interconfessional (a
partir de pontos de acordo entre diversas entidades religiosas).
O impacto causado pelo texto,
especialmente quanto à desoneração do Estado, levou à aprovação de nova
redação, suprimindo a ausência de ônus aos cofres públicos, vedando o
proselitismo e delegando aos sistemas de educação a tarefa de estabelecer os
conteúdos e as qualificações profissionais exigidas, desde que ouvida entidade
civil específica.
2º Existe em nosso País uma
pluralidade religiosa e de várias matrizes, alem de muitas seitas.
O Brasil não pode ser
considerado como um país cristão tão somente pela imposição de seus primeiros,
colonizadores, ou nos dias atuais por ter maioria católica e evangélica somados
deu conforme o senso de 2010 um total de 89 por cento, dividido em: 60 por
cento de católicos e 29 por cento de evangélicos. Pois bem, e os outros 11 por
cento?
3º O Lugar do Ensino Religioso
é na Igreja e em casa (no Lar) porque é uma questão privada e de fórum íntimo,
ou, uma questão coletiva privada com respaldo nos estatutos das entidades
religiosas.
A expressão religiosa de um
povo deve ser produto do ensino das religiões nos templos e na família. A
crença religiosa dos cidadãos brasileiros é matéria de foro íntimo, não de foro
público. Tal foro parte da liberdade de consciência e da formação recebida na
família e conseqüentemente na Igreja. Isso tem uma conseqüência muito clara e
direta para o que se refere ao Estado. Idéia esta defendida pelos pensadores
desde o século XIII e pelos reformadores do século XVI.
O ensino religioso na família
tem um papel importantíssimo na formação do indivíduo, ou melhor, na formação
da pessoa como um todo, pois a família é a célula mater da sociedade. O núcleo
familiar é o primeiro grupo social do qual participamos e recebemos, não
somente herança genética ou material, mas principalmente moral. Nossa formação
de caráter depende, fundamentalmente, do exemplo ou modelo familiar que temos
na formação de nossa personalidade.
A Igreja tem o ministério
docente de levar o homem a não somente conhecer a Deus, mas o dever conhecer a
si mesmo e de amar o próximo. O programa de educação religiosa nas igrejas é
necessário para a instrução e o desenvolvimento de seus membros capacitando-os
para o serviço cristão e o desempenho de suas tarefas no cumprimento da missão da
igreja no mundo.
Conclusão:
Cremos que o ensino
religioso nas escolas não é definido segundo a lei federal, 9394 LDB, se é ou
não cristão, e por isso mesmo que se é para ser implantado conforme esta Lei em
epigrafe há a necessidade de se abranger
o maior número possível de credos, cultos e expressões religiosas em nosso País
para se garantir o direito de livre expressão, opinião e crença, sob o risco de
ignorarmos tais manifestações culturais e tornar-nos este dispositivo de lei
como proselitismo e intolerância religiosa, o que contraria o espírito da
própria lei. A meu ver seria inviável,
dada a pluralidade de opiniões, credos e ciltos.
Por outro lado, reduzir o
ensino religioso às próprias convicções religiosas, à historicidade cultural ou
familiar é crime de discriminação religiosa, e o pior, as nossas crianças são
as mais vulneráveis, pois não poderão questionar ou discordar do professor por
ainda não ter conhecimento em tese de outras crenças e cultos.
Entendo que o Ensino Religioso
a médio ou a curto prazo poderá acender atavismos segregadores do ódio entre as
pessoas e mesmo entre os credos o que já causou tanto sofrimento e preconceito
não somente no Brasil mas no mundo.
A Escola deve ser um ambiente
pacífico onde o respeito às diversidades, a tolerância e o amor ao próximo
estejam presente indiferente dos atestados de fé dogmática. Ademais, todo ser
humano tem, também, uma grande necessidade de convivência com seus semelhantes,
que se dá através da solidariedade, da amizade, dos relacionamentos, da
empatia, da alegria, do convívio e da fraternidade.
Por outro lado, a ausência de
ensino religioso nas escolas não impede que a cultura religiosa da caridade,
respeito pelas diferenças entre os alunos, a qual vem da família ou ministrada
nos seus espaços próprios.
Por fim, a pratica do amor
fraterno independe dos dogmas e dos estatutos das religiões pois ele é um
serviço desinteressado, humanamente desinteressado, onde prevaleça o respeito à
dignidade da pessoa humana.
Histórico e evolução do Ensino Religioso
Primeira fase: de 1500 a 1889
Regime jurídico
de Estado-religião: 1549 – Seis missionários jesuítas chegam ao Brasil e
fundam, em Salvador, o colégio da Companhia de Jesus.
1759 – Os
jesuítas são expulsos pelo Marquês de Pombal. O ensino público passa para
outros setores da Igreja Católica.
1824 – Passa a
vigorar a primeira Constituição do País, que define o catolicismo apostólico
romano como religião do Império.
Segunda
fase
Regime jurídico de plena separação
Estado-religião Período: de 1890 a 1930
1890 – O Decreto 119-A proíbe a intervenção federal na religião e consagra a liberdade de cultos. 1891 – A primeira Constituição republicana define a separação entre Estado e quaisquer religiões e define que todas são aceitas no Brasil.
Terceira fase
1890 – O Decreto 119-A proíbe a intervenção federal na religião e consagra a liberdade de cultos. 1891 – A primeira Constituição republicana define a separação entre Estado e quaisquer religiões e define que todas são aceitas no Brasil.
Terceira fase
Regime jurídico de separação atenuada
Estado-religião Período: de 1931 a 2008
1931 – Decreto de Getúlio Vargas reintroduz o ensino religioso facultativo nas escolas públicas.
1934 – O artigo 153 da Constituição define que o ensino religioso será facultativo e de acordo com a confissão religiosa do aluno.
1931 – Decreto de Getúlio Vargas reintroduz o ensino religioso facultativo nas escolas públicas.
1934 – O artigo 153 da Constituição define que o ensino religioso será facultativo e de acordo com a confissão religiosa do aluno.
1946 – Uma nova Constituição é promulgada, mas
mantém os moldes da anterior quanto ao ensino religioso.
1961 – A primeira Lei de Diretrizes e Bases
(LDB 4024/61) propõe no artigo 97 que o ensino religioso constitui disciplina
das escolas oficiais, cuja matrícula é facultativa.
1967 – A nova Constituição diz que o ensino religioso facultativo integra disciplina das escolas oficiais de grau primário e médio.
1967 – A nova Constituição diz que o ensino religioso facultativo integra disciplina das escolas oficiais de grau primário e médio.
1969 – A Emenda Constitucional 1/1969 mantém a
mesma redação da Constituição de 1967.
1971 – A segunda Lei de Diretrizes e Bases (LDB 5.692/71) mantém o ensino religioso facultativo em estabelecimentos oficiais de 1º e 2º graus.
1971 – A segunda Lei de Diretrizes e Bases (LDB 5.692/71) mantém o ensino religioso facultativo em estabelecimentos oficiais de 1º e 2º graus.
1988 – O artigo 210 da Constituição mantém as
mesmas normas anteriores e assegura o livre exercício de cultos religiosos.
1996 – A nova Lei de Diretrizes e Bases (LDB
9.394/96) define o ensino religioso como facultativo, mas introduz duas modalidades:
confessional e interconfessional.
1997 – O artigo 33 da LDB 9.394/96 estabelece que os sistemas de ensino regulamentarão a definição dos conteúdos do ensino religioso facultativo.
Quarta fase
1997 – O artigo 33 da LDB 9.394/96 estabelece que os sistemas de ensino regulamentarão a definição dos conteúdos do ensino religioso facultativo.
Quarta fase
Regime concordatório
Período: de 1999 até agora
2009 – O Executivo assina o Acordo
Brasil-Santa Sé, pelo qual o ensino religioso, católico e de outras confissões
religiosas, é facultativo em escolas públicas de ensino fundamental.
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